segunda-feira, 24 de maio de 2010

FILOSOFIA DO LINCHAMENTO






Publicado em 23/05/2010

Ao contrário do que afirmam histericamente lideranças da direita e a mídia brasileira, a mediação do Brasil e da Turquia para o encontro de uma solução pacífica para a questão nuclear iraniana é louvável. Fica difícil de mensurar se a reação ao acordo foi pior da parte dos Estados Unidos ou da mídia conservadora.

A agressividade de Madame Clinton deixou claro que Washington, pressionado pelo lobby sionista e pelo complexo industrial militar, não quer negociar coisa alguma, mas apenas enquadrar o Irã e tentar de todas as formas se intrometer em assuntos internos de um país soberano. A China e a Rússia contraditoriamente, uma vez que num primeiro momento apoiaram as gestões dos países emergentes, decidiram apoiar a proposta dos EUA no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas.
E como fica agora depois que a agência Reuters divulgou informação segundo a qual o Presidente Barack Obama 15 dias antes da assinatura do acordo tinha estimulado Lula a tentar a negociação? Será que Obama não manda e foi desautorizado por Madame Clinton, pelo complexo militar e pelo lobby sionista? 

O papel subserviente da mídia conservadora é deveras lamentável. A TV Globo, por exemplo, foi ouvir em Israel um extremista de direita do governo Benyamin Netanyahu com tom ameaçador contra Teerã e entrevistou um cidadão israelense dizendo que ele era iraniano. O cidadão pode ter nascido no Irã, mas abdicou da nacionalidade iraniana para se tornar israelense e defender o ideário nacionalista de direita do sionismo, uma deturpação do judaísmo.

No noticiário da madrugada da Globo, seguindo a pauta do Departamento de Estado norte-americano foi convocado para desancar sobre Lula e Celso Amorim o “analista” Arnaldo Jabor, que com as suas gracinhas de sempre chegou a falar da “infiltração comunista” no Itamaraty. Lamentável e vale uma indagação: a quem o senhor Jabor está servindo? Os outros canais não foram diferentes no furor contra o acordo.

Editorial do jornal O Globo, em tom agressivo, com o título “Anatomia do fracasso da política externa”, não poupou Lula com o objetivo de incutir em seus leitores que o Presidente brasileiro deu “vexame”, como entenderam os articulistas do periódico. No mesmo dia, em matéria paga, um obscuro pastor, de uma obscura entidade pentecostal denominada Associação Vitória em Cristo, considerava o acordo Brasil-Irã “uma vergonha”. Os grupos pentecostais hoje na matriz EUA ou por aqui são radicais defensores do sionismo e defendem ações ainda mais violentas contra o Irã, em conformidade com os dirigentes israelenses que estão loucos por uma aventura bélica contra o Irã.

Voltando a O Globo, o furor do jornal de hoje contra Lula, Dilma Roussef, Hugo Chávez, Cristina Kirchner, Ahmadinejad, e o posicionamento histórico contra Raúl e Fidel Castro me fez recordar os anos 80, mais precisamente o primeiro governo de Leonel Brizola no Estado do Rio Janeiro.

Nesse sentido, o competente jornalista Pinheiro Júnior, ex-editor do caderno cidade de O Globo contou, em uma recente reunião do Conselho Deliberativo da ABI, que o então diretor de redação do referido jornal, Evandro Carlos de Andrade, cobrava diariamente dos jornalistas matéria contra Brizola. Pinheiro disse que a chefia de reportagem, conhecendo a política do jornal tomava providências para sempre haver notícias ou reportagens contra o governador do Estado do Rio, principalmente sobre os Cieps. Mas quando não havia nada, Evandro Carlos de Andrade não fazia por menos e deixava claro: “Te vira, arranja alguma coisa contra Brizola, porque o doutor Roberto (Marinho) quer”.

Entendo ser importante mencionar o fato, não só porque agora em junho fazem seis anos da morte de Brizola, como também porque a filosofia de O Globo não mudou. Uma semana antes da morte de Brizola, o diretor executivo de jornalismo da Rede Globo, Ali Kamel, culpava o político trabalhista pela violência no Rio.

Hoje, Brizola não está mais na pauta de O Globo, tendo sido substituído por Lula e demais líderes mundiais acima mencionados. Como resposta, as entidades da sociedade civil brasileira, ABI, OAB, Clube de Engenharia, para ficarmos em algumas, deveriam se empenhar, como foi sugerido aqui no Direto da Redação por Mair Pena Neto, em apresentar os nomes de Lula e do Primeiro-ministro turcoTyyiq Erdogan para o Prêmio Nobel da Paz. Seria uma forma de corrigir o que aconteceu o ano passado quando Barack Obama, hoje mais interessado na guerra (Iraque, Afeganistão e pressão contra o Irã) do que na paz propriamente dita, foi o premiado .
Em suma, quer queiram ou não Madame Clinton, as Organizações Globo e os grupos pentecostais, países emergentes como o Brasil e Turquia demonstraram na prática que através do diálogo e das negociações, a paz ainda é possível. Mas se prevalecer à vontade de Madame Clinton que representa os falcões, a paz ficará distante. 

Ah, sim: todo cuidado é pouco, pois o Departamento de Estado pode querer colocar as mangas de fora contra o governo Lula em função do posicionamento brasileiro pela paz. Historicamente, sucessivos governos estadunidenses sempre agiram de forma golpista contra quem não aceita as suas exigências. 

O IRÃ QUE EU CONHECI ( Sonia Bonzi )




Depois de ter morado no Irã, minha maneira de ver o mundo mudou bastante. Não acredito em mais nada do que diz a grande mídia. Quando soube que ia morar em Teerã senti um certo medo, mas aceitei o desafio. Comecei uma busca voraz por informações sobre o país, a cidade, a história, o povo. Depois de tudo que li, decidi que viveria em casa, reclusa, lendo, escrevendo, fazendo crochet, inventando moda... 




Parti de Londres pronta para o sacrifício. Teria que conviver com os xiitas radicais, terroristas cruéis, apedrejadores de mulheres, exterminadores de homossexuais, homens-bomba, mulheres oprimidas, cobertas com véus... Eu estava submetida às leis locais e me seria vedado mostrar cabelos, pernas e braços. Ficar em casa era o que mais me atraia. Vestir um chador para sair me parecia um pouco demais. A caminho de Teerã eu depositava o sucesso da minha estadia nos jardins da casa onde fui morar. Ter aquele espaço me bastaria. 

Logo ao sair do aeroporto comecei a ter uma imagem diferente de tudo aquilo que eu tinha lido. Tudo tão bonito, belas estradas, muita luz, viadutos com mosaicos, jardins bem cuidados, gente vendendo flores nos sinais, um engarrafamento sem buzinas, pedestres poderosos cruzando entre os carros, rapaziada de cabelo espetado, mocinhos com camisetas apertadinhas, moças lindas, super produzidas e também muitas mulheres de chador. Parques cheios de gente. Muita criança. Muito pic nic. 

Dizem que a primeira impressão é a que vale. Gostei da chegada. Não tive medo. Não vi tanques, cadafalsos, escoltas armadas... Gostei das caras, das montanhas, das casas, das árvores, dos muros, do alfabeto que me tornava analfabeta. 

Logo no segundo dia eu já tinha entendido que minha leitura sobre o cotidiano não tinha nada de realidade. Eu não precisava usar chador. Podia sair vestida com uma calça comprida, um camisão de mangas compridas e um lenço na cabeça. Senti-me nos anos 70, quando eu não dispensava um lencinho. 

Deixei o jardim de casa e fui conhecer Teerã. A imprensa e os meios de comunicação do ocidente me deixavam confusa. O que eu lia e ouvia não correspondi ao que eu vivia e via. Encontro um povo é acolhedor, educado, culto, simpático, que gosta de fazer amigos, que abre as portas de casa para os estrangeiros, gosta de música, de dança, de declamar poesia...

Não encontrei os problemas de abastecimento que me informaram haveria. Comprava-se de tudo, inclusive uísque e vodka. Bastava um telefonema. 

Os temíveis homens-bomba nunca passaram por lá. Ninguém se explodia. Foi horrível constatar que enforcamentos aconteciam de vez em quando. Apedrejamento de mulher adúltera já não acontecia há 14 anos. Fiquei amiga de muitos gays, fiz e fui a festas espetaculares, tomei vinho feito em casa, viajei sem escoltas pelo país, visitei amigos em suas casas de campo, de praia, de montanha... 

Apaixonei-me pela culinária refinadíssima, morro de saudades das nozes, pistaches, castanhas, avelãs, frutas secas. Não me esqueço dos pães, do iogurte, do suco de romã puro ou com vodka... Conheci a Pérsia profunda: lagos salgados, desertos salgados, as antigas capitais, segui a "rota da seda", dormi em caravanserais... Sempre assessorada por amigos locais.

Não conheci um iraniano, de nenhuma classe social, que fosse favorável ao regime teocrático instalado no país. Só uma coisa aproxima o povo do governo: o direito à tecnologia nuclear. A pressão do ocidente fortalece e radicaliza os aiatolás. O povo do Irã não aceita esta interferência mundial. Quem são os ocidentais para dizer a eles o que fazer? Eles não vêem o ocidente como um modelo a ser seguido. 

Eles não acreditam nos governos que já apoiaram Sadam Hussein numa guerra contra eles. Eles não tem razão para acreditar nas grandes potências. Isto incomoda. Melhor demonizá-los. Eles são acusados de não cumprirem acordos. Quem os acusa também não cumpre. O domínio da tecnologia nuclear é considerado pelo povo do Irã como um direito deles, que sempre tiveram grandes cientistas, que sempre valorizaram o conhecimento, a medicina de ponta, que querem vender energia nuclear.. 

O povo iraniano não começa uma guerra há mais de 200 anos. Eles não são belicosos. São diferentes de seus vizinhos. A instabilidade no Oriente Médio não é causada pelo Irã. Apesar da força que a imprensa, os governos, as corporações fazem para denegrir a imagem do Irã, eu confesso que o Irã que eu conheci não é o que é descrito pela mídia ocidental. 

Não há favelas em Teerã, não há miseráveis pelas ruas. Minorias tem seus representantes no Congresso, judeus tem seus negócios, suas sinagogas, zoroastrianos tem acesa a chama em seus templos. A família é uma instituição valorizada. Refugiados palestinos e iraquianos são mantidos pelo governo e pelo povo iraniano, que lhes oferece abrigo, alimento e escolas... 

Não acredito que ameaças e o uso da força possam melhorar a situação na região. Os iranianos não são os iraquianos. Ser mártir para defender a religião ou a pátria é motivo de júbilo até para as mães. A negociação, o respeito, a falta de arrogância, as informações corretas são as armas para defender a estabilidade no mundo. Pena que muitos interesses financeiros estejam acima dos sonhos de bem-estar e paz.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

A Torcida contra o Brasil




O mal estar da grande mídia por conta do acordo Brasil-Irã-Turquia
Este final de semana foi cômico para a mídia conservadora que não conseguiu disfarçar o seu mal estar e incômodo com o acordo obtido pelo governo brasileiro com o Irã a respeito da contenda do programa nuclear da nação persa. Na sexta e no sábado, a tônica unânime da mídia hegemônica brasileira foi que o presidente Lula estaria "perdendo tempo", quie estava "arriscando a credibilidade internacional do país" ao tentar negociar com um governo já qualificado como "pária", "autoritário", "desequilibrado", entre outros.

No domingo, a Folha de S. Paulo estampou na matéria sobre o tema o título "Irã dá ao Brasil um polêmico protagonismo" com duas linhas finas: "Gestões de Lula conseguem reduzir isolamento de Teerã e adiar sanções na ONU, mas dificilmente resultarão em recuo iraniano" e "Esforços por acordo com país persa têm gerado críticas à política externa brasileira; presidente se reúne hoje com Ahmadinejad e Khamenei ". A matéria do jornalista enviado especial a Teerã, Sammy Adghirni começa com o seguinte lide: "A despeito do discurso otimista, a mediação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas conversas sobre o programa nuclear iraniano provavelmente não surtirá efeito" As críticas citadas na linha fina vieram de um analista do jornal Washington Post e de um ex-assessor do governo dos EUA, Bill Clinton. Fontes dos EUA. país diretamente interessado em isolar o Irã p or conta da sua estratégia geopolítica internacional que privilegia o enfraquecimento dos países adversários dos Israel e o fortalecimento deste (que, diga-se de passagem, possui armas atômicas).

O jornal O Estado de S. Paulo vai na mesma linha e busca apoio para esta posição na aparentemente insuspeita candidata do Partido Verde, a senadora ex-petista Marina Silva, que critica a tentativa de um diálogo com um "governo que desrespeita os direitos humanos".

Bem, chega o domingo à noite e o acordo é acertado entre Brasil, Irã e Turquia. A aposta no fracasso dá lugar ao ceticismo com misto de inveja e dor de cotovelo. O portal da revista Veja lembra que o Irã já "descumpriu" acordos anteriores e por isto, nada garante que este vai ser cumprido. Lembra ainda que o acordo está restrito a uma das usinas, mas a secretária Hillary Clinton acreditqa existir outras instalações nucleares no Irã. o portal da Veja só esqueceu de lembrar que o governo Bush também disse que o Iraque tinha armas de destruição em massa e por isto invadiu-o. As investigações posteriores mostraram que esta informação era falsa e tudo não passou de um pretexto para aquela guerra absurda.

Na mesma toada de ser cético - agora não quanto a fazer o acordo, mas sim quanto à eficácia do acordo - vieram Folha e Estadão. O jornalão dos Mesquita novamente usaram Marina Silva para reforçar o ceticismo: Para a senadora, a estratégia do Irã ao fechar acordos como o do ano passado e o atual é ganhar tempo. "É bom não perder a perspectiva histórica, de que aquele país tem perseguido a construção de artefatos nucleares e da bomba atômica. Há indícios que preocupam", avaliou (trecho da matéria publicada no portal Estadão hoje).

Na Folha on line, a forma de tentar reduzir a importância do acordo foi destacar o anúncio de que o Irã afirmou que irá continuar enriquecendo urânio a 20% (em uma linha final de um dos vários textos do portal UOL, é dada a informação - sonegada emn quase todas notícias - de que para fazer uma bomba atômica é necessário enriquecer urânio a 90%!). Também repercutiu as opiniões céticas de "analistas internacionais" - sempre dos EUA e das potências nucleares européias, interessadas diretas em bloquear o acesso dos países em desenvolvimento à tecnologia nuclear, porém deu espaço para um articulista iraniano que deu uma visão diferenciada, enfatizando o papel importante de mediação do Brasil e da Turquia, vistos como países "amigos" do Irã, ao contrário dos demais membros do Conselho de Segurança da ONU.

O que chama a atenção nesta cobertura? Primeiro, o alinhamento ideológico da mídia conservadora a uma política internacional de submissão aos Estados Unidos e demais potências mundiais, criticando qualquer iniciativa internacional independente da chancelaria brasileira, em especial a geopolítica Sul-Sul. Segundo, a transformação do espaço de noticiário em lugar de manifestação explícita de opinião e uma "quase torcida" para que estas iniciativas da chancelaria brasileira fracassem e, quando dão certo, a recusa em reconhecer o erro de avaliação. E, terceiro, a postura desavergonhada de ocultação de informações (por exemplo, que este enriquecimento do urânio no Irã não é suficiente, nem de longe, para a fabricação de armas nucleares), de escolha ideológica de fontes (todas elas das grandes potências, em especial dos EUA) e a tentativa de construção de um consenso de que a açã o política das "potências ocidentais" é o lado do bem e o Irã, o lado "mau".

E, travestidos de vestais do bem, os jornais pouco deram espaço - como dão, por exemplo, quando a China ou Cuba expulsam um dissidente político - ao fato de que Israel impediu o pensador judeu norte americano Noam Chomsky de fazer uma palestra em Ramallah porque ele é um crítico áspero da política israelense para os palestinos. Será que isto não é ataque à "liberdade de expressão" ou isto acontece só quando vem do Chave, do Castro ou do Lula?

Professor da Escola de Comunicações e Artes da USP, coordenador geral do CELACC (Centro de Estudos Latino Americanos de Cultura e Comunicação) e membro do Alterjor (Grupo de Pesquisa de Jornalismo Popular e Alternativo).

quarta-feira, 5 de maio de 2010

A Grécia e o FMI, um roteiro de terror contra o povo



O Brasil viveu, no passado recente, pilhagem semelhante à que ameaça o povo grego como condição para o megaempréstimo internacional cujo objetivo é salvar os banqueiros que fizeram empréstimos especulativos para a Grécia e agora, à beira do precipício, tentam jogar o custo da crise sobre os ombros dos trabalhadores e do povo.


O pacote negociado pelo governo grego prevê um conjunto de más notícias aos trabalhadores para acertar o acesso a uma montanha de recursos que praticamente nem chegarão a sair dos cofres das entidades emprestadoras pois serão empregados para liquidar parcelas da dívida externa grega (parte das quais vencem no próximo dia 19). E que o povo grego terá que pagar com um arrocho inaudito nos próximos três anos, permitindo ao governo "reequilibrar" as finanças do país.


O Brasil viveu situação semelhante na crise da divida nos anos 1980 e em 1998. Nesta última, sob Fernando Henrique Cardoso, o país quebrou e o governo tucano acertou um empréstimo de 40 bilhões de dólares com o FMI com objetivo semelhante: garantir o pagamento dos juros aos banqueiros internacionais. Da mesma forma, aquele dinheiro nem chegou a sair dos cofres dos bancos, mas ficou por lá como garantia de que o país pagaria suas contas. E o peso daquele empréstimo caiu duramente sobre os ombros dos trabalhadores e do povo: para satisfazer a voracidade dos banqueiros, FHC se comprometeu a gerar superávits primários que sabotaram a capacidade de investimento do Estado, a adotar metas draconianas de inflação (comprometendo o desenvolvimento nacional), a aumentar o tempo de trabalho para a aposentadoria e reduzir os valores das pensões, a arrochar os salários e reduzir o número de funcionários públicos. O resultado foi um enorme empobrecimento dos brasileiros e o agravamento da estagnação econômica.

Esse mesmo filme de terror está sendo exibido em Atenas e nas demais cidades gregas. O FMI, a União Européia e os banqueiros europeus (particularmente os alemães, principais credores da dívida externa grega) impõem um receituário semelhante: aumento dos impostos, redução do déficit orçamentário grego de 13,6% para 3% até 2014, flexibilização das leis trabalhistas facilitando as demissões de trabalhadores, aumento da idade média para aposentadoria de 53 para 67 anos, redução dos valores das pensões, que passarão a serem calculadas com base na média dos salários ao longo da carreira e não mais o último vencimento recebido pelo trabalhador. Além disso, o congelamento dos salários dos funcionários públicos, que vigora este ano, será estendido até 2014 e haverá cortes no 13º dos trabalhadores.

Desde o final do ano passado, quando a crise grega eclodiu, os trabalhadores resistem contra a ofensiva patronal e dos banqueiros e se recusam a pagar pela crise. Nos últimos dias, a resistência cresceu e as manifestações se espalham por todo o país, pontilhado de confrontos com a polícia. Os sindicatos e partidos da esquerda (o Partido Comunista Grego entre eles) marcaram uma grande greve para o próximo dia 5. A previsão de sucesso da manifestação está baseada no dado divulgado pelas agências de pesquisa: mais de 50% dos gregos apoiam as manifestações e os protestos e não aceitam o alto custo da cobrança por uma crise econômica que não criaram mas que decorre de negócios escusos entre o governo e os banqueiros internacionais.

Quando a crise mundial eclodiu, em 2008, muita gente viu nela a submersão das doutrinas neoliberais e das práticas lesivas aos povos e aos trabalhadores promovidas por governos conservadores e banqueiros gananciosos. Mas o neoliberalismo não estava vencido e, passado o momento crítico, voltou aos mesmos truques para garantir lucros fáceis e espoliativos, como revelam as notícias ligadas à grave situação de países como a Grécia e, também, ligadas a negócios obscuros e fraudulentos promovidos por corretoras financeiras como a Goldman Sachs, de Nova York. A batalha contra o neoliberalismo e o vampiresco rentismo financeiro internacional prossegue. Uma de suas etapas está sendo vivida pela resistência popular nas ruas das cidades gregas.


Extraído  de www.vermelho.org.br

segunda-feira, 3 de maio de 2010

A esdrúxula e antibrasileira oposição de Serra ao Mercosul

 A esdrúxula e antibrasileira oposição de Serra ao Mercosul


O ex-governador paulista defende que o Mercosul retroceda para uma simples área de livre comércio, fase anterior à atual, de união aduaneira.

Como argumentou em palestra a empresários mineiros, na semana passada, o objetivo declarado é nos livrarmos de “uma barreira para o Brasil fazer acordos comerciais”. Para ele, “a união aduaneira é uma farsa, exceto quando serve para atrapalhar”. Assim, “ficar carregando este Mercosul não faz sentido” (Valor, 20/04/10). Os ataques de Serra repercutiram tão mal que geraram reações até mesmo do chanceler argentino, além de forçar uma entrevista do candidato, nitidamente na defensiva, para se explicar na Folha de São Paulo, no último domingo.
A reação em si é positiva, demonstrativo de que a idéia da integração ganha espaço e força no imaginário e na forma brasileira de ver o mundo, enfim, no projeto nacional brasileiro.

Os ataques de Serra ao Mercosul partem de uma limitada visão mercantilista primária, lente exclusiva pela qual parece enxergar a inserção internacional do Brasil. Assim, propõe que a variável central de política externa brasileira seja a busca de acordos comerciais com países ricos, aparentemente, independente de seus custos.
No lançamento de sua pré-candidatura, o tucano já havia sinalizado essa visão. Em tom queixoso, estarreceu-se com o fato de que “nos últimos anos, mais de 100 acordos de livre comércio foram assinados em todo o mundo. São um instrumento poderoso de abertura de mercados.  Pois o Brasil, junto com o Mercosul, assinou apenas um novo acordo (com Israel), que ainda não entrou em vigência!”.

Não interessa ao Brasil, nem ao Mercosul, celebrar acordos de livre comércio no formato proposto pelos países centrais.  Por exemplo: nesta semana, tendo em vista a realização em maio próximo da Cúpula de chefes de estado do Mercosul e da União Européia, foram retomados contatos entre os dois blocos para explorar possibilidades de anuncio do relançamento das negociações comerciais, nas próximas semanas, em Madri. Entretanto, as negociações vêm sendo travadas devido ao fato de que a “a indústria (européia) aumenta as exigências e agora cobra do Mercosul abertura de 100% de seu mercado, e não apenas de 90%, como até então” (Valor, 26/04/10). Os 10% referem-se a uma lista ]de bens protegidos por tarifas em setores estratégicos que necessitem de proteção, algo absolutamente legítimo e largamente praticado pelos países ricos no caminho que os levou ao desenvolvimento.

Mesmo se observarmos pela ótica estritamente comercial, é preciso ter em conta, antes de mais nada, que os países ricos, nomeadamente União Européia e Estados Unidos só aceitam acordos comerciais de tipo assimétrico com os países em desenvolvimento, com uma agenda similar ao que eram as propostas da ALCA.
Os países desenvolvidos (EUA e UE à frente) reproduzem essencialmente tratados assimétricos e desiguais – que lembram, em sua essência, os tratados desiguais que o Brasil assinou no século XIX após sua independência, os quais impediram sua industrialização precoce tal como defendida por José Bonifácio.

Atualmente, os modelos de TLC’s com países ricos envolvem quase que um “contrato de associação” à economia norte-americana ou européia, proibindo, por exemplo, exigência de conteúdo nacional em compras públicas ou determinados incentivos em política industrial – sem tocar é claro, nos escandalosos subsídios à agricultura dos países ricos. No caso europeu, em alguns países, a simples manutenção de uma vaca gera benefícios monetários diretos ao agricultor, enquanto altas taxas são impostas aos produtos agrícolas provenientes dos países em desenvolvimento.

O caminho proposto por Serra – “flexibilizar” o Mercosul e privilegiar TLC’s com países centrais –, do ponto de  vista econômico, representa atar nosso destino numa relação de dependência em relação ao bloco dos países ricos, uma vez que impõe pesados constrangimentos à autonomia e a soberania brasileira sobre sua política econômica e industrial. Em síntese, “flexibilizar” o Mercosul atenta fortemente contra o interesse nacional.